quarta-feira, 15 de junho de 2011

A Noite Virou Dia ~ Chapter 1

Vanessa levantou naquela manhã não tão ensolarada e esfregou os olhos. Olhou para as outras camas e viu que nenhuma de suas amigas havia levantado ainda. Garotas preguiçosas, ela pensou. Olhou no relógio e viu que havia acordado um minuto antes do despertador tocar. E ele tocou.
6h.
As garotas resmungavam sem querer acordar e o despertador continuava gritando desesperado. Vanessa calçou os chinelos e entrou no banheiro, vendo algumas meninas levantarem e fazerem o mesmo trajeto. Elas tinham meia hora para estarem no salão do café e mais meia hora para estarem nas devidas salas.
O modo como elas eram tratadas naquele lar não era dos melhores. Talvez por elas serem “reles” órfãs e os coordenadores não ganharem nenhum tostão para cuidar delas. Era a mesma coisa com os meninos. Eles não eram bem tratados.
O orfanato St. Paul não era o melhor das redondezas, até por que alguns órfãos não saíam de lá ao crescer. Era o que as amigas de Vanessa pretendiam fazer. Crescer lá e trabalhar por lá mesmo, já que elas praticamente não tinham uma vida. Mas isso não era o que Vanessa queria. Tudo bem que eles não tinham uma família. Só tinham uns aos outros, mas ela não queria passar sua vida inteira dentro de um orfanato. Por mais ousado e impossível que pudesse parecer, ela queria sair, trabalhar, construir uma família e ser feliz como qualquer um, mas ninguém acreditava que isso pudesse acontecer.
Ela saiu do banho e esperou por uma de suas amigas, a que terminasse primeiro. Selena veio.
- Muito simpática a maneira que eles nos acordam. –ela resmungou. Selena era a que mais falava, mas não fazia nada. Era óbvio que ninguém gostava dali, mas continuavam lá.
- Tô falando. Por que a gente não sai daqui e vai morar em outro lugar? –Vanessa perguntava, vendo Selena revirar os olhos.
- Vanessa, qual é? Você sabe que é quase impossível sair daqui.
- Não! Não é impossível! Nos documentos que o Gary pegou aquele dia, tem dizendo que ao completar dezessete, qualquer um de nós pode juntar as trouxas e ir embora! –ela disse frenética. Gary era um bom amigo. Ele era um dos únicos que também queria sair dali e fazer a sua vida.
- Você e o Gary ainda vão passar maus bocados por causa disso. –Selena disse enquanto elas desciam as escadas em direção ao salão.
- Não importa. Falta só um mês, eu completo dezessete e sumo daqui! –Vanessa exclamou. – Selena, é uma chance de viver! Cara, vem comigo!
- Se você quer ir para a sua aventura que vai dar furada, vai, mas eu não vou junto. A gente já conversou sobre isso.
Vanessa suspirou e elas entraram no salão de refeição. Logo elas pararam e viram que algo estava errado.
- Mas o que é isso? –Amy perguntou chegando atrás das amigas.
- Não sei. –Selena disse.
- Eu só sei que eles estão bem ferrados. –Vanessa disse observando. As garotas se amontoaram atrás delas, não se atrevendo a entrar no salão.
Os garotos estavam em pé, formando uma fila de frente pra porta. A coordenadora, Trudy, estava andando de um lado para o outro, berrando com eles empunhando sua inseparável palmatória. Trudy não batia nos mais velhos, ela batia nos menores, por serem indefesos.
- O que será que eles fizeram? -algumas garotas cochichavam lá atrás. A última vez que a Trudy acordou os garotos mais cedo pra dar uma bronca ou coisa parecida foi há um ano, eles haviam se aquietado, mas ela só fazia isso quando envolvia assuntos pessoais dela.
- UMA SEMANA SEM JANTAR! -a coordenadora berrou, ouvindo o burburinho e os resmungos dos rapazes. - SEM SAIR DO QUARTO!
As garotas taparam a boca e se afastaram para a Trudy poder passar, berrando com elas também. Assim que a mulher estava fora do salão, os garotos iam saindo atrás dela. Não podiam desobedecer as ordens dela. Embora os professores não concordassem, também não podiam descordar.
Vanessa viu Zac vir ao lado de Gary, de cabeça baixa e foi ao encontro deles, seguida por Selena e Amy:
- O que houve? -ela perguntou abraçando o namorado. Vanessa e Zac namoravam há bastante tempo. E eles realmente se gostavam.
Zac olhou pros lados e depois olhou pra Gary, que devolveu o olhar.
- Eiiin gente, o que houve? -Amy perguntou aflita.
- A Trudy descobriu tudo. -Zac respondeu. As meninas se entreolharam confusas.
- Descobriu tudo o quê?
- Tudo! -Gary exclamou. - Descobriu do documento lá que eu roubei, descobriu da festa que a gente fez pro Nigel no quarto, descobriu que alguns rapazes estão fumando, descobriu tudo!
Vanessa olhou pra Selena e depois pra Amy, ambas estavam pasmas.
- E agora? -Selena perguntou.
- E agora que nós estamos perdidos. -Zac disse. Vanessa segurou o rosto dele com as mãos.
- Vocês vão ficar uma semana sem comer trancafiados dentro daquele quarto? -ela perguntou horrorizada.
- Parece que sim. -Zac tirou as mãos dela. - Eu acho melhor nós irmos.
- É verdade. A gente se vê no céu. -Gary disse saindo. Vanessa abraçou Zac novamente e encostou sua boca na dele, de leve.
- Não morre. -ela disse. Ele deu uma piscadela pra ela e saiu ao lado de Gary.

- Amy... Amy acorda! -Vanessa sussurrava no escuro, cutucando a amiga para que ela acordasse. - Acorda!
Amy resmungou algo e abriu os olhos, confusa.
- Quê que foi? -perguntou sentando na cama.
- Eu vou ao quarto dos meninos. -Vanessa disse. Amy esfregou os olhos e abriu a boca:
- Pirou?
- Eu preciso que você vá comigo, pra ficar vigiando a porta. -a outra continuou.
- Vanessa, que idéia maluca é essa?
- Amy, eles passaram o dia sem comer. -Vanessa mostrou uma sacola cheia de pães. - Eu roubei da cozinha.
Ela abafou uma risada e olhou pra Amy, que suspirou e levantou da cama.
- Se nós formos pegas? -perguntou.
- Não vamos. Se alguém vir, você bate na porta de leve e eu saio. E se perguntarem o que você faz fora do quarto, diga que precisava de água! -Vanessa exclamou.
- Está certo, vamos. -Amy levantou e calçou os chinelos.
Elas flutuaram, sorrateiramente, até o quarto dos garotos. Amy postou-se na porta e Vanessa entrou, procurando por Zac.
- Zac... -ela encontrou a cama e começou a cutucá-lo. - Zac, acorda!
O rapaz abriu os olhos com dificuldade e os estreitou para vê-la melhor.
- Vanessa? Mas o que você faz aqui? -ele perguntou erguendos-se na cama.
- Você tá legal? -ela perguntou sentando na cama ao lado dele. Zac passou os dedos pelos olhos e bocejou.
- Sim, legal. -respondeu cabisbaixo. - O que...?
Ela lhe mostrou o saco cheio de pães que furtara da cozinha. Zac abriu a boca e coçou o cabelo, deixando-o mais bagunçado ainda.
- Onde você conseguiu isso? -ele perguntou pegando a sacola. Vanessa sorriu ao ver a empolgação de Zac.
- Na cozinha.
- Ficou doida? E se a Trudy perceber?
- Ela não vai perceber.
Zac pegou na mão da namorada e tentou vê-la melhor naquele escuro.
- Não precisava. -ele disse.
- Precisava sim. Vão ficar uma semana sem comer? Você divide entre os garotos. -ela falou levantando da cama. - Preciso ir. Amy está vigiando a porta.
- Tudo bem. -ele disse largando a mão dela.
- Será que você pode dar um jeito de me encontrar no porão amanhã? Eu preciso mesmo falar com você. -ela perguntou. Zac coçou o nariz e balançou a cabeça afirmativamente. Não era tão fácil assim tentar escapar de um castigo aplicado pela Trudy.
- Acho que posso.
- Eu espero você depois da aula de biologia.
Ele afirmou e Vanessa mandou um beijo no ar pra Zac, saindo do quarto em seguida. Amy virou ao vê-la sair e suspirou aliviada.
- Achava que você tinha decidido dormir por lá mesmo. -ela resmungou enquanto voltavam para o quarto.
- Bem que eu queria. -elas riram e entraram no quarto novamente.

O sinal para o término daquela aula de biologia bateu e Vanessa voou até o porão. Ela entrou e sentou no sofá que ficava por lá, esperando pelo namorado.
Zac entrou no porão dois minutos depois. Ela levantou e lhe abraçou - como sempre fazia.
- Oi. -ela disse sorrindo. Zac sorriu e a puxou para um beijo. Parecia que eles não faziam aquilo há séculos.
- Oi. -respondeu ao partir o beijo. - O que você queria?
Vanessa o puxou para sentar o lado dela no sofá. Não sabia bem como falar aquilo.
- Eu... -ela suspirou. - Você sabe que eu vou embora desse lugar daqui a um mês, não sabe?
Zac abaixou a cabeça e levantou em seguida:
- Você não vai. -ele disse decidido.
- Vou sim...
- Não, não vai.
- Vou sim! -ela exclamou irritada. - Claro que vou, Zac, eu não vou apodrecer nesse lugar! Aqui não tem nada pra mim!
- Lá fora também não! Me diz, o que você vai fazer lá fora? -ele perguntou.
- E me diz o que você vai fazer aqui dentro!? -ela rebateu. Eles fecharam os olhos e Vanessa continuou. - Nós podemos trabalhar até conseguir um quarto, não sei...
Ela dizia e o rapaz balançava a cabeça negativamente.
- Não Vanessa. Eu não vou. -Zac disse decidido. Ela piscou algumas vezes, absorvendo aquela idéia. Certo, Zac já tinha dito que não ia, mas por que ela estava reagindo daquele jeito se já tinha a resposta?
- Por favor, vem comigo! -ela pedia. - O que eu vou fazer lá fora sem você?! Você é a única pessoa que eu tenho Zac!
- Por isso que eu não quero que você vá. Por que eu só tenho você. -ele disse e se aproximou dela. Segurando o rosto da namorada com as mãos, ele encostou sua testa na dela. - Eu te amo. Você sabe disso, não sabe?
Vanessa suspirou e balançou a cabeça afirmativamente.
- Mas não tem nada pra mim lá fora. -ele continuou. Vanessa se afastou dele.
- Não tem nada pra mim aqui dentro. -ela levantou do sofá e ia saindo do porão. Zac coçou a cabeça atordoado e levantou indo atrás dela.
- Vanessa! -ele segurou em seu braço e a garota virou pra trás. - Por que você está fazendo isso? Por que quer tanto sair daqui?
- Por quê? Eu mereço uma vida bem melhor do que essa aqui! Este não é um lugar pra mim! -ela exclamou.
- E aonde você vai morar? Você não tem família, lembre disso. -ele disse enterrando as mãos nos bolsos. Vanessa fungou e enxugou os olhos.
- Não precisa lembrar. -ela fez menção de sair novamente e Zac balançou a cabeça. Era o ponto fraco dela - lembrar que ela não tinha família.
Ele a puxou novamente e lhe deu um abraço.
- Eu não queria te deixar triste. Não há nada pra nenhum de nós lá fora. -ele disse.
- Há sim. Eu vou sair daqui, não importa o quanto vocês falem, eu vou sair daqui, eu vou embora. -ela fungou novamente e Zac a largou.
Por mais que ele resistisse, queria sair dali. Todos queriam. E doía ouvir a namorada falar daquele jeito, mas não tinha coragem de falar nada.

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